Em meio a dores e gemidos silenciados pelo poder das muralhas das instituições, estou preso na solidão de ideais que não são mais valorizados. Permaneço marcado com as chagas causadas pelo poder da ortodoxia protestante e do “evangeliquez gospel”, que busca “almas-clientes” e impérios para jesus.
Em terras tupiniquins, estou-estamos nós rodeados pelas Igrejas-reinos, ou até mesmo dentro delas. Estamos maculados pela “inquisição” do espírito do poder. Inquisição que é silenciosa, caminha pelas vielas da vida e pelos des-caminhos medíocres e podres dos reinos pessoais, que eles chamam de igreja. Quando vemos... Fui-fomos atingidos pelas flechas desses “ungidos”. Flechas da indiferença, do preconceito, do fundamentalismo, da exploração e das falsas esperanças.
Igrejas e “ungidos” que após usarem os seus membros, como assim eram chamados, os desprezam e os colocam à margem. Pena que já se esqueceram das lágrimas, do sangue e da força que os Josés, as Marias e os Pedros – hoje, meros “Zé ninguém” – entregaram para a criação dessas comunidades, assim pensadas anteriormente, comum-unidade. Esses, agora marginalizados, pensavam na comunhão, no amor, no serviço, na “casa dos pobres”, não no império-gospel. Cooperavam para o Reino de Deus, mas, hoje são tratados como habitantes do deserto, falta-lhes a terra prometida – essa seria o poder? Hoje, diversas igrejas passam a ser utilizadas para planos pessoais, para visões míopes e para sustentar a graça comprada.
Igrejas que marcam, mancham e ferem os seus irmãos e irmãs. O que fazer nessas instituições onde o poder e a lama da vergonha estão presentes? O que fazer com a minha-nossas marcas? Porque permanecemos nesses reino-igreja-pessoais?
Permaneço pelo sorriso das crianças. Crianças do projeto “Portas Abertas” da Igreja Metodista de Piracicaba. Lá, não cultuamos em mega-templos, mas em baixo de árvores, símbolos do cumprimento do Reino semeado em esperança. Essas crianças desejam conhecer esse Deus que se faz amigo e constrói com elas uma história. Esse Deus que brinca, celebra a vida e defende os pequenos. Crianças que me levam a semear, mesmo com a dor da incerteza e da insegurança.
Estou na Igreja pela força, fé e esperança da minha mãe: Maria. Mãe que me revela o lado materno de Deus, o Deus-mãe. Maria que me ensinou o amor de Jesus, que me ensinou de forma bem Batista, o caminho da salvação. Maria-mãe que no cuidado acalma as inquietudes do Daniel que chora. Mulher que celebra com o menino dan, quando ele conta os seus sonhos. Mãe que entende, suporta, ama, perdoa, sonha, semeia, luta... Essa mulher que ajudou a construir Igrejas, a cuidar de pessoas e a levar boas novas em caminhões, em caminhonetes e em motos, me motiva a permanecer. Não permaneço pela instituição, mas pelos outros que choram, sofrem e precisam de uma olhar, mesmo que eu pareça um samaritano. Continuo, como ela me ensinou, pelo Totalmente outro, o Cristo, o Deus com cheiro de gente.
Permaneço pela memória do meu pai. Esse, para os ortodoxos protestantes, nem foi para o céu, pois não levantou a mão em um apelo para aceitar ao Cristo. Meu pai me ensinou a sorrir, a dançar, a ver a vida como local de festa, ao puro som de Luiz Gonzaga: “Que falta eu sinto de um bem...”. Quantas saudades... Por “painho”, aquele que nunca foi membro de uma denominação protestante, mas se relacionava com o divino, permaneço. Esse era um de seus orgulhos: um filho “crente”. Menino tímido que gostava de estudar e de ouvir as pessoas. Ainda bem que ele não viu o que a igreja tem feito desse e de tantos outros meninos sonhadores.
Permaneço pelos amigos que comigo sentem a dor e a tristeza desse evangelho opressor e vendido. Amigos que foram marcados pelos fundamentalismos, pelas inquisições, pelas ditaduras das “assembléias de membros”. Com e por eles prefiro seguir esse caminho, embora doa.
Ainda utópico e sonhador ando pela esperança e pela força da fé nesse Deus que se revela na promessa e no cumprimento do Reino: a vida plena para todos os seres humanos, a restauração da criação e a profunda relação entre Deus, os seres humanos e a natureza. Confio nesse Deus que nos amou e nos ama. Sigo com o Cristo, que caminha conosco, pois se fez gente. Permaneço sustentado no Espírito, fonte de vida para os meus-nossos ossos secos... Amém!
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Daniel Souza é colunista do site Bom Líder, poeta e estudante de teologia na Universidade Metodista de São Paulo. Membro da Igreja Batista da Paulicéia, em São Bernardo do Campo e colaborador no Projeto "Portas Abertas" da Igreja Metodista em Piracicaba.

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